Instalação Performática de Santiago Cao.
Acionada ininterrompidamente do dia 15 ao 17 de setembro de 2010.
Casa da Cultura, Recife, Brasil. Durante o festival SPA das Artes.
Ação levada a cabo junto a Rayr Dos Santos Silva (apoio de tecnologia de informática) e Luis Cavalcanti (pedreiro).
Texto traduzido para o português por Bruna P. Jung
Agradecimentos enormes a Paulo Mello por financiar o projeto.
Duração: 3 dias.
Registro Narrativo: Diante da insegurança manifestada pelos meios massivos de comunicação, a sociedade responde isolando e encerrando o “ameaçante” em cárceres e manicômios, ao mesmo tempo em que se distancia construindo espaços fechados e exclusivos onde somente poucos podem entrar. A gaiola de cimento e a gaiola de ouro. Duas variantes do encerro, duas caras de uma mesma moeda. Cada vez mais, estamos perdendo as relações inter-pessoais. A situação é preocupante. Estamos nos distanciando e o “outro” é um desconhecido com quem melhor não entrar em “contato”. De igual maneira as telecomunicações deslocaram a comunicação pessoal. Telefone celular, mensagens de texto, correios eletrônicos. Cada vez menos pessoas conversam “cara a cara”. O corporal é deslocado pelo modo virtual. Um muro invisível nos separa. Em “Espaços [in]Seguros” esse muro se torna visível e a metáfora resulta um encerro. Dentro da “Casa da Cultura” de Recife, antiga cárcere hoje convertida em centro comercial para turistas, um pedreiro construiu com tijolos e cimento quatro paredes encerrando-me num espaço de 1,30 x 1,80 mts. Permaneci dentro de esse espaço reduzido pelo lapso de três dias, comunicado com o exterior unicamente via internet. Sem janelas nem portas, a única comunicação possível foi a través de um computador conectado ás 24 horas. Três dias transmitindo em direto via Internet por meio de um servidor de Streaming, utilizando uma câmera web e relacionando-me com as pessoas a través de um chat. Três dias esperando. Somente esperando. Deixando passar o tempo até ser liberado, paradoxalmente, pela mesma pessoa que me encerrou; por esse “outro” do qual me escondia. Por fora, em um dos lados da construção, estava instalado um segundo computador configurado para conectar-se unicamente ao Streaming. Dessa maneira as pessoas que por aí passavam podiam escolher ver o “Espaço [in]Seguro” do lado de fora o sentar-se frente ao computador e, por meio da transmissão, ver o interior e interatuar comigo a través de um chat. Durante o encerro optei por não ingerir nenhum alimento sólido, bebendo unicamente água de coco e água mineral podendo assim, desde o jejum, desintoxicar meu corpo e vivenciar, em tanto obra processual, uma transformação física e emocional. Momentos prévios á liberação, mudei a câmera que estava no angulo da construção pela que estava no em meu computador. A primeira tinha um campo de visão melhor… permitia captar o espaço desde um ângulo mais amplo e mostrava uma vista superior de minha pessoa que dava a sensação de ser uma pessoa vigiada, da qual somente se via sua cabeça. Uma imagem quase anônima… um rosto quase difuso. Mas, para a liberação, a câmera do computador (que captava um plano frontal da parede) permitiria ver “de perto” o instante em que o pedreiro rompera com cinzel e martelo os tijolos abrindo um buraco por onde liberar-me. E, assim, por esse mesmo buraco, poderia transmitir em direto o que estava por fora… para os que do lado de fora viram por meio de seu monitor esse “por dentro”. Já liberado, a câmera seguiu transmitindo durante um dia mais, de maneira tal que quando algum curioso o curiosa se acercava para olhar o interior através do buraco na parede, era por sua vez retransmitido pela câmera web do meu computador. Dessa maneira, enquanto as pessoas acercavam a cabeça e ingressavam parcialmente ao “Espaço [in]Seguro”, seu corpo ia se “virtualizando”, criando-se a paradoxo de um terceiro lugar ou espaço. O atual (a pessoa – de corpo presente – introduzindo sua cabeça na construção de tijolos e cimento), o virtual (a pessoa transmitida via câmera web) e o cruze de ambas, onde simultaneamente as demais pessoas presentes no lugar podiam ver “um corpo sem cabeça” – ao introduzir a mesma no buraco – e “uma cabeça sem corpo” segundo escolhessem observar aquela pessoa de corpo presente ou a través da tela do computador localizado ao lado da construção. Ao dia seguinte de haver sido liberado, quando fui a iniciar a desmontagem encontrei-me com duas meninas pequenas que, brincando com a instalação, permitiram-me entender uma questão que não havia sequer imaginado. A temporalidade e seus possíveis desdobramentos. Seu jogo consistia em assomar-se pelo buraco na parede e dançar em frente á câmera do computador instalado dentro para logo correr até o segundo computador, localizado por fora. Nessa tela, e por causa do “delay”, elas conseguiam ver-se a si mesmas, e, como se de outras meninas se tratasse, viam-se a elas mesmas assomando a cabeça dentro do buraco, dançar e desparecer da tela do computador. Em um mesmo ato, elas eram motores de ação e espectadoras de si mesmas. Eram “elas” e “outras” ao mesmo tempo. O retardo da transmissão criava assim um paradoxo tempo-espacial. Elas, que 5 segundos antes estavam saltando frente á câmera num tempo e espaço presente, agora se encontravam duplicadas num tempo e espaço virtual. E prefiro designar com o nome de “virtual” e não de “representado”, já que no caso da imagem transmitida – em tanto não era uma reprodução gravada, re-apresentada, se não uma transmissão “em vivo e direto”– era o retardo o que permitia a coexistência num mesmo tempo presente, de esses dois tempos e espaços. Coexistência que criava, fruto do cruze de ambas, um terceiro tempo e lugar. Hasta esse momento eu podia diferenciar, a grandes traços, dois tipos de temporalidades… uma atual, presente, e uma representada, mediada, voltando a apresentar-se. Mas no caso das meninas, não posso utilizar a noção de representação em tanto que aquele teletransmissão, sem ser previamente imprimida, gravada, carecia de possibilidade de ser novamente reproduzida. E isso é o que caracteriza a diferencia entre o que poderíamos chamar de “presente-atual” e o “reapresentado-atualizado”. Ai, diante desse jogo e diante dessas meninas, estava frente a um novo tipo de temporalidade. Um tempo defasado 5 segundos do tempo atual. Um tempo virtual. |